quarta-feira, 26 de agosto de 2009

O avião e o planeta.

Sem dúvida, o avião é uma máquina. Esse instrumento nos permitiu descobrir a verdadeira fisionomia da terra. Na verdade, durante séculos, as estradas nos enganaram. Parecíamos aquela rainha que desejou conhecer os seus súditos e saber se eles gostavam do seu reinado. Os cortesãos para iludí-la, ergueram cenários felizes ao longo da estrada e pagaram a artistas para que dançassem ali. Fora daquele estreito caminho ela nem sequer entreviu nada, e não soube que pelos campos adentro seu nome era amaldiçoado pelos que morriam de fome. Assim, nós caminhávamos ao longo de estradas sinuosas. Elas evitam as terras estéreis, os rochedos, os areais; seguem as necessidades do homem e vão de uma fonte a outra fonte. Assim, enganados pelas curvas, que são indulgentes mentiras, perlongando, no curso de nossas viagens por essas estradas, embelezamos, durante muito tempo, a imagem de nossa prisão. Pensamos que esse planeta fosse úmido e suave. Mas nossa vida se aguçou e fizemos um progresso cruel. Com o avião aprendemos a linha reta. Logo que decolamos abandonamos essas estradas que se inclinam para os bebedouros, ou serpenteiam de cidade em cidade. Libertados, desde logo, das servidões queridas, libertados da necessidade das fontes, apontamos a proa para o alvo longíquo. Só então, do alto de nossas trajetórias retilíneas, descobrimos o embasamento essencial, o fundo de rocha, de areia, de sal em que, uma vez ou outra, como um pouco de musgo entre ruínas, a vida ousa florescer. Então somos transformados em físicos, em biologistas , examinando essas civilizações que enfeitam o fundo dos vales e às vezes, por milagre, se estendem como parques onde o clima as favorece. Então podemos julgar o homem por uma escala cósmica, observando-o através de nossas vigias como se fora através de instrumentos de estudo. Então, relemos a nossa história. Exupery em "Terra dos Homens"

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